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La novela indigenista no es expresión interior del mundo indígena; lo es, sí, ..... tuvimos que remolcarlo desde la bals
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A AMAZÔNIA PERUANA NA NARRATIVA INDIGENISTA Ximena Antonia Díaz Merino – Universidade Estadual do Oeste do Paraná RESUMO: No que se refere à representação do autóctone americano e especialmente na procura de uma identidade nacional andina é de grande importância o período compreendido entre meados do século XIX e a primeira metade do século XX. Período em que surgiu uma ampla gama de projetos raciais desenvolvidos por intelectuais da época, entre os que se destaca o indigenismo. Os questionamentos referentes aos projetos raciais têm sido abordados e discutidos por escritores hispanoamericanos em suas obras constituindo narrações nas que se faz uma reflexão sobre a nacionalidade, a construção da identidade nacional e dos sujeitos nacionais. Este tipo discursivo é um instrumento eficaz para promover o desenvolvimento e a representação das novas preocupações da sociedade e se apresenta como resposta válida aos requerimentos de um novo público leitor. Um processo de renovação narrativa que tem alcançado diversos graus de aproximação, conhecimento e penetração ao mundo andino. Destaca-se neste estudo a narrativa do escritor, educador e jornalista peruano Ciro Alegría que retratou em suas narrativas o drama social do indígena da Amazônia andina na primeira metade do século XX. PALAVRAS-CHAVE: Indigenismo; Amazônia; Ciro Alegría. La novela indigenista no es expresión interior del mundo indígena; lo es, sí, globalmente, de la historia de las naciones que quedaron divididas por el trauma de la conquista y de sus secuelas coloniales y neocoloniales. (CORNEJO POLAR, 1979, p. 70)

INTRODUÇÃO A figura do indígena hispano-americano tem sido objeto de estudo e tema literário ao longo da história, isto pode verificar-se nas crônicas de viagens, nos relatos dos conquistadores e dos colonizadores, assim como na literatura indianista, indigenista e neo-indigenista. A imagem do indígena tem sido construída a partir do olhar do “outro”, ou seja, de um escritor que não pertence ao universo cultural do indígena, mas, ainda que seja uma descrição feita “de fora” esses escritos permitem visualizar um importante substrato cultural indígena. No que se refere à representação do autóctone americano e especialmente na procura de uma identidade nacional andina é de grande importância o período compreendido entre meados do século XIX e a primeira metade do século XX. Nesse espaço de tempo surgiu um amplo espectro de projetos raciais que foram desenvolvidos pelos intelectuais da época, entre os que se destaca o indigenismo: “estudio sociológico y antropológico del indígena iberoamericano, estudio que se proyecta sobre el plano político hacia la reivindicación social y económica de aquél” (RODRIGUEZ-LUIS, 1990, p. 41). Na segunda metade do século XIX o indianismo literário, desenvolvido dentro do Romantismo, tinha como objeto de estudo o “bom selvagem”, narrativa que revelava uma imagem exótica e individualista do homem americano. Mais tarde, o escritor e político peruano Manuel González Prada escreveu sobre o verdadeiro Peru aborígene reivindicando a necessidade de denunciar a condição do indígena, especialmente do andino, através uma perspectiva mais realista e menos romântica,

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Al indio no se le predique humildad y resignación, sino orgullo y rebeldía. ¿Qué ha ganado con trescientos o cuatrocientos años de conformidad y paciencia? Mientras menos autoridades sufra, de mayores daños se libera. […] En resumen: el indio se redimirá merced a su esfuerzo propio, no por la humanización de sus opresores (GONZÁLEZ PRADA, 1976, p. 44)

Esse novo olhar com respecto ao indígena foi abraçado pelos indigenistas com o intuito de, por um lado, combater os grupos oligárquicos que se empenhavam em implantar um perfil hispânico na América, e por outro, favorecer as figurações mestiço-indígenas. Esta redefinição do nacional a partir de uma perspectiva indigenista se transformou na tarefa dos intelectuais e escritores da época. Os escritores indigenistas denunciaram em suas narrativas a exploração exercida pela oligarquía peruana sobre o homem andino, fato que, de acordo com Cornejo Polar (2000, p. 200), contribuiu para que a literatura indigenista passa-se a formar parte “do vasto e extenso movimento antioligárquico das primeiras décadas do século XX” . A estratégia utilizada pelos escritores indigenistas para denunciar e reivindicar os direitos dos grupos autóctones foi a descrição detalhada da condição inumana em que viviam, como se pode observar no seguinte fragmento da novela Huasipungo (1934) do escritor equatoriano Jorge Icaza, Era la Cunshi que se había cagado en la cama como si fuera guauga tierna. —Cumu si juera guagua tierna - repite el indio mirando las piernas y el culo embarrado de la hembra, sin atreverse a reprenderla, sin atreverse a decirle nada. — Ve pes, tuditicu hechu'na pushca. Saliendo a la puerta llama al perro: Totolo tototooooo. Con cara de fiesta se presenta el animaluco y, a una indicación del amo, hace el aseo de las piernas de la enferma. El indio pasa la mirada de la lengua del perro, que lame los excrementos, a la cara de la Cunshi, que sopla fiebre (ICAZA, 1966, p.111-112).

No fragmento citado se observa a figura degradada do indígena equatoriano, além da utilização de uma linguagem grosseira. De acordo com o escritor mexicano Alberto Escobar isto se deve a que: […] el “indigenismo” fue, en todas partes, un documento agrio, sombrío y rabioso que invocaba la esperanza por el camino del desengaño y de la indignación […] Pocos períodos quedarán para la historia de nuestras letras, dominados, como ése, por una impresión tan deprimente: mosaico de figuras postradas y envilecidas. (In: ALEGRÍA, 1971, p. 7)

É importante lembrar que a literatura indigenista envolve as obras escritas por brancos ou mestiços que tratam sobre os indígenas, no entanto, o escritor, jornalista, sociólogo e ativista político peruano José Carlos Mariátegui (1894-1930) enfatizou que essa literatura [indigenista] não deveria ser descartada somente pela herança de seus autores e asseverou que: […] la mayor injusticia en que podría incurrir un crítico sería cualquier apresurada condena de la literatura indigenista por su falta de autoctonismo integral o la presencia, más o menos acusada en sus obras, de elementos de artificio en la interpretación y en la expresión. La literatura indigenista no puede darnos una versión rigurosamente verista del indio. Tiene que idealizarlo y estilizarlo. Tampoco puede darnos su propia ánima. Es todavía una literatura de mestizos. Por eso se llama indigenista y no indígena. Una literatura indígena, si debe venir, vendrá a su tiempo. Cuando los propios indios estén en grado de producirla (MARIATEGUI, 2002, p. 306).

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A MESTIÇAGEM As questões raciais na América Latina têm sido assunto de discussão ao longo da história tendo prevalecido por muitos anos projetos que posicionam o ocidental e as pessoas consideradas “brancas” superiores às “não-brancas”. Neste momento se faz oportuno resgatar o fato de que desde a

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De acordo com o pensamento de Mariátegui a literatura indigenista deve ser considerada um importante aporte para refletir sobre a maneira como foi representada a presença indígena na literatura numa época em que todo o indígena era desprezado. Para levar a cabo esta reflexão é necessário, em primeiro lugar, discutir o significado do conceito de mestiçagem, para, depois, observar na obra de Ciro Alegría Bazán a configuração de seus personagens indígenas.

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conquista do “Novo Mundo” os espanhóis organizaram uma jerarquia racial que lhes garantiria a maioria dos benefícios e recursos. Mais tarde, em inícios do século XVII o Inca Garcilaso de la Veja, primeiro escritor mestiço hispano-americano, enumerou em seu livro histórico-literário Comentarios Reales (1616) a existência de dissésseis divisões raciais no Peru. Garcilaso de la Vega comenta em sua obra que das três nações: espanhola, indígena, e negra, “se ha hecho allá otras, mezclados de todas maneras, y para las diferenciar les llaman por diversos nombres […]” (GARCILASO DE LA VEGA, 2002, p. 252). De acordo com Garcilaso de la Vega ocupam o cume da pirámide os espanhóis e espanholas nascidos na Espanha, chamados de “españoles” ou “castellanos,” denominação que segundo o Inca proporciona maior estatus às pessoas e indica que são “de más calidad por haber nacido en la patria” (2002, p. 253). Enquanto que os filhos dessas mesmas pessoas são denominados “criollos” ou “criollas,” e são de um nível inferior por ter nascido nas “Indias” (2002, p. 253). Esta última classificação provocou ressentimento entre os criollos em relação ao sistema colonial e mais tarde contribuiu para o desejo de independizar-se da Espanha. O Inca Garcilaso de la Vega apresenta com detalhes cada união possível e explica que “A los hijos de español y de india, o de indio y española, nos llamamos mestizos, por decir que somos mezclados de ambas naciones,” (2002, p. 253); também comenta que “mestizo,” era o “nombre impuesto por los primeros españoles que tuvieron hijos en Indias” e destaca que a maioria dos mestiços associa a palavra com menosprezo (2002, p. 253). Garcilaso asseverou também que, “Al hijo de negro y de india, o de indio y de negra, dicen mulato y mulata. A los hijos de éstos llaman ‘cholo’ un vocablo empleado por los españoles por ‘infamia y vituperio’ que quiere decir ‘perro’” (2002, p. 253). Como constatado acima, os escritos de Garcilaso de la Vega ilustram claramente uma jerarquia que privilegia o branco e menospreza o indígena, o mestiço e o branco nascido na América. Como consequência dos estereótipos negativos associados aos grupos não-brancos o racismo científico condenou a mestiçagem, difundindo a noção de que as pessoas híbridas herdavam os traços negativos dos grupos primitivos, e considerava especialmente perniciosos os indígenas (NOUZEILLES, 2004, p. 289). A ideia de que a mestiçagem tinha efeitos negativos perdurava ainda no final do século XX, como pode observar-se na definição dada pela lexicógrafa espanhola María Moliner sobre o vocábulo mestiçar: “adulterar la pureza de una raza por el cruce con otras” (MOLINER,1994, p.402). A pesar de considerar que a heterogeneidade racial dos países da América Hispânica representava um obstáculo para o progresso e a civilização os intelectuais do período posterior à Independência dos Estados Americanos (1810-1825) não aceitaram que uma pessoa branca da América Hispânica fosse considerada inferior a uma pessoa branca da Europa. Ao contrario, esses intelectuais consideraram essa heterogeneidade um caminho para a construção de identidades nacionais homogêneas unindo as populações racial e etnicamente diversas, condenando, dessa maneira a noção negativa da mestiçagem. De acordo Nouzeilles (2004, p. 291) este modelo foi o que predominou no México fomentando a mestiçagem entre os elementos raciais já presentes na população. Também de acordo com Gabriela Nouzeilles (2004, p. 291), outros projetos raciais advogavam pela mestiçagem, mas unidos a um processo de branqueamento facilitado por programas de imigração massiva da Europa. Segundo a interpretação do pensamento do racismo científico feito pelas elites, com estas medidas se podia esperar a homogeneização das diferentes populações criando países mais estáveis e produtivos. Os questionamentos referentes aos projetos raciais têm sido abordados e discutidos por escritores hispano-americanos em suas obras, sobre este fato Gloria Hintze de Molinari (1999, p.106107) declarou que a “actitud de renovación” na narrativa do século XIX na América Hispânica converte a novela no espaço apropriado para a manifestação e definição dos papeis dos sujeitos que compõem as novas repúblicas; nessa nova narrativa aparecem temáticas relacionadas com a reflexão sobre a nacionalidade, a construção da identidade nacional e a dos sujeitos nacionais. Esse tipo discursivo é um instrumento eficaz para promover o desenvolvimento e a representação das novas preocupações da sociedade e se apresenta como resposta válida aos requerimentos de um novo público leitor. Nesse processo de renovação na narrativa a nação e seus sujeitos, assim como a aproximação à realidade indígena tem sido tema de obras de muitos autores hispano-americanos, os quais têm

alcançado diversos graus de aproximação, conhecimento e penetração ao mundo andino. Esse é o caso de Ciro Alegría (1909-1967), escritor, educador e jornalista peruano, que retratou em suas primeiras novelas a alma indígena: La serpiente de oro (1935), Los perros hambrientos (1939) e El mundo es ancho y ajeno (1941).

De acordo com o escritor uruguaio Ángel Rama (1987, p. 142) a narrativa indigenista “extiende la reclamación que formula a todos los demás sectores sociales oprimidos y se hace intérprete de sus reclamaciones que entiende como propias”. Los escritores indigenistas foram a voz dos indígenas ao reivindicar os direitos dessa massa humana menos favorecida socialmente. Graças a esses escritores o homem andino passou a ser o assunto principal dos escritos indigenistas. Textos nos que se denuncia o racismo, a exploração e a situação de miséria imposta pelas classes andinas dominantes sobre seus nativos. Os autores indigenistas a pesar de não pertencer ao universo sobre o qual escreveram se preocuparam em produzir um discurso o mais fidedigno possível da realidade indígena descrita, revelando um conhecimento profundo desses grupos sociais. As narrativas indigenistas caracterizam-se pela ênfase colocada na descrição da paisagem, da natureza, de suas personagens, dos costumes e hábitos, assim como da situação sócio-política dos grupos indígenas. Portanto, constata-se que os escritores indigenistas se afastam da literatura indianista do século XIX na que os indígenas eram elementos de fundo, sendo retratados através de uma imagem exótica e idealizada. Na narrativa indianista, assim como na indigenista se apresenta a situação do indígena dentro da sociedade hispano-americana, mas a intenção dos indigenistas não era somente dar a conhecer a situação do nativo, mas objetivava denunciar a pobreza e a injustiça à que este era submetido, assim como reivindicar seus direitos. De tal maneira que as principais

diferenças entre o indianismo e o indigenismo poderiam resumir-se em três pontos: tom de denuncia, afastamento da imagem romântica do indígena e a familiaridade ou intimidade dos autores indigenistas com o mundo relatado, tendo como prioridade apresentar um indígena de carne e osso. Nesse tipo de narrativa o indígena deixa de ser pano de fundo para ser a personagem principal, retratada de forma realista e não mais idealizada nem exótica .

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[…] Nací en una hacienda, crecí en otra— ambas pertenecientes a la provincia de Huamachuco, en los Andes del Norte del Perú—, y desde niño hube de andar largos caminos para ir a la escuela y el colegio, situados en la ciudad andina de Cajabamba y en la costeña de Trujillo. Así me llené los ojos de panoramas y conocí al pueblo de mi patria. Mujeres de la raza milenaria me acunaron en sus brazos y ayudaron a andar; con niños indios jugué de pequeño; siendo mayor alterné con peones indios y cholos en las faenas agrarias y los rodeos. En brazos de una muchacha trigueña me alboreó el amor como una amanecida quechua. Y en la áspera tierra de surcos abiertos bajo mis pies y retadoras montañas alzadas frente a mi frente, aprendí la afirmativa ley del hombre andino (ALEGRÍA, 1964)

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A NARRATIVA INDIGENISTA DE CIRO ALEGRÍA Ciro Alegría Bazán escreveu com fidelidade sobre os temas concernentes aos problemas da opressão indígena, assim como sobre as diferenças sociais sofridas pelos nativos peruanos submetidos à cômoda e exigente classe superior peruana. Suas obras constituem documentos de protesto sobre a situação do indígena, posto que Peru, ao igual que a maioria dos países latino-americanos, apresenta problemas graves no que se refere à integração indígena, um grupo humano marginalizado e esquecido que para se proteger e preservar sua cultura se refugiou na serra ou na selva peruana, regiões afastadas da civilização urbana do século XX, uma realidade na que predomina o analfabetismo e a superstição. A situação indígena peruana tem sido estudada e narrada ao longo de décadas sem chegar a alcançar o verdadeiro espírito indígena, constituindo o denominado “indigenismo desde afuera”, mas foi a partir dos escritos de Ciro Alegría que se começou a falar de um “indigenismo desde dentro”, uma realidade vista e relatada por um homem que esteve em contato direto, desde sua infância, com índios e mestiços, como o próprio Alegría o registrou no prólogo à décima edição de El mundo es ancho y ajeno:

Em suas narrações Ciro Alegría faz uma transposição de suas vivencias e lembranças pelo que podem ser considerados relatos realistas. Descreveu de forma minuciosa as personagens e a natureza, demonstrando um alto grau de intimidade com os fatos narrados. Alegría revelou que para sobreviver nessa natureza exuberante e indomada, esses “cholos” têm que adaptar-se a ela ao mesmo tempo em que a modificam para poder satisfazer suas necessidades cotidianas, assim também se faz patente a opressão que exercem os donos de terras sobre a massa indígena, sequela deixada pela Colônia. É através destas problemáticas que o autor peruano revela o drama social do indígena andino na primeira metade do século XX, dando especial atenção às histórias que ouviu da boca de alguns indígenas que chegavam com certa regularidade à fazenda de seus pais à procura de refugio e alimentação, como se pode observar na seguinte declaração de Alegría (1941): […] Un día llegó a refugiarse un indio comunero llamado Gaspar y otro día un indio colono llamado Pancho. Ambos contaron dramáticas historias. Gaspar andaba perseguido por sublevarse y gran parte de las tierras de su comunidad le habían sido arrebatadas. Pancho llegó con el poncho en hilas, arreando un mohíno jumento que cargaba todos sus bienes y seguido de su escuálida mujer y su hijo, un pequeño de grandes ojos asustados. La Policía no arribó nunca por Gaspar, pero comprendí toda su nostalgia de la tierra perdida una vez que lo oí tocar su antara, desgarradamente, tarde la noche y en soledad […] La hacienda está en las riberas del río Marañón. Una vez llegó un hombre de río abajo, con una enorme llaga tropical que le estaba comiendo un brazo. Mi padre lo curó y él se quedó a vivir en Marcabal. Se llamaba Manuel Baca y era un gran narrador de cuentos y sucedidos, fuera de ser diestro en cualquier faena […].

No que se refere à relação homem-natureza os escritores hispano-americanos têm narrado a exuberância dos mais variados espaços geográficos, um deles tem sido a região da Amazônia, e o rio Amazonas em especial. Sobre a relação homem-natureza-selva amazônica peruana se pode citar a primeira novela de Ciro Alegría intitulada La serpiente de oro (1935), um discurso regionalista que revela a relação do indígena peruano com o rio Marañón, importante rio do Peru e um dos principais afluentes do curso alto do rio Amazonas na vertente do Atlântico. A obra foi escrita durante o tempo de exilio no Chile e lhe mereceu no mesmo ano de sua publicação (1935) o primeiro lugar no concurso da Editorial Nacimiento auspiciado pela Asociación de Escritores de Chile. Nessa novela curta, que se insere na denominada “novela da terra ou regionalista” circunscrita dentro do indigenismo, se narra a luta pela sobrevivência num espaço duplo: por um lado oferece sustento, riqueza e admiração, por outro, sua exuberância indômita inspira temor. A novela de Alegría apresenta um relato narrado por suas personagens, ou seja, a vida no Marañon é apresentada segundo a consciência de seus próprios habitantes. Uma sociedade mestiça fruto da mistura entre espanhóis e indígenas da zona andina, região habitada pelos “cholos” peruanos. A leitura da novela vai revelando um mundo desconhecido para o leitor: seus costumes, seu folclore, sua língua indígena (quéchua) e sua língua popular (quéchua-espanhol), assim como o relato oral passado de geração em geração, o qual configura uma dimensão vital para seus habitantes, como pode ser constatado no seguinte fragmento de La serpiente de oro:

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Dessa maneira, a linguagem passa a ser um elemento importante na configuração da literatura indigenista posto que para alcançar uma maior veracidade é necessário registrar a língua utilizada pelos cholos apresentada na obra através dos diálogos e dos relatos das personagens. Esta técnica se expressa mediante uma nova ortografia e uma nova sintaxe que registram a peculiar forma de falar desses homens e mulheres, como se pode observar no fragmento transcrito a seguir: “Si, pué —dice

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Don Juan conocía la vida de la región a través de la suya, luenga y trabajada, y se remontaba al pasado con las propias palabras de sus antecesores. En las agrestes realidades pureñas la palabra rueda de boca en boca y cada relato pasa de los padres a los hijos y a los hijos de los hijos hasta nunca acabar. Cuando los hombres de las serranías abren sus bocas aparecen jirones irrevelados de épocas lontanas con toda su frescura y su propio sabor. El relato es cifra, letra, página y libro. Pero libro animado y vivo. (ALEGRÍA, 1971:52)

don Matías— cosita que quisiera saber es la muerte e los pajaritos. Nunca mei encontrao nuño muerto puel campo salvo al que lo haiga desplumao una culebra (…) pero entón se nota. Muerto po su muerte mesma nunca” (ALEGRÍA, 1971, p. 45). A linguagem ajuda a reconhecer as fronteiras sociais e através dela é possível identificar o lugar de origen, o ambiente social e o nivel de instrução do falante, é o caso de La serpiente de oro, obra em que o contraste lingüístico é fundamental para traçar o perfil de suas personagens. Pode-se perceber que na obra de Alegría a linguagem rural está presente em diálogos carregados de palavras arcaicas, com sonidos do sustrato quéchua e nomes de animais e árvores desconhecidos na linguagem urbana, como por exemplo nas comparações em que se alude à qualidades de animais e plantas para ilustrar as características do homem andino: No sé que mirada tiene para mí, si mirada de paloma o de tuco, o de víbora […] una pelusa de melocotón verde entre la cual una que otra barba surge solitaria como manguey en pampa […] y ya no son solamente relinchos, balidos, gritos….Hasta el rumor de la lluvia, el estremecimiento de las hojas, el silbo del viento y el bramido del río hablan ahora del puma azul (ALEGRÍA, 1986, p. 190, 17, 151)

Em La serpiente de oro Alegría trata do cotidiano dos cholos balseros do vale de Calemar às margens do rio Marañon. O autor destaca o estreito contato que se estabelece entre homem e natureza: “El hombre es igual al río, profundo y con sus reveses, pero voluntarioso siempre” (ALEGRÍA, 1971, p. 12). Os calemarinos reverenciam o rio que é sua fonte de trabalho e de alimento, mas ao mesmo tempo lhe temem, pois é a força que eventualmente pode arrebatar-lhes seus bens e até a própria vida. Nessa novela a personagem principal é o rio, ele rege a vida do homem que vive dele, como foi registrado por Alegría (1941) no Prólogo à décima edição de El mundo es ancho y ajeno: Con La serpiente de oro, como ya he manifestado muchas veces, no pretendí escribir una novela al modo clásico. Quería que el personaje central fuera el «Marañón» mismo, presidiendo la vida de los balseros y gentes de aquellas regiones, presentada en cuadros rápidos de los cuales el nexo fundamental sería el río.

No decorrer da narrativa o engenheiro se interna na floresta e se alegra ao encontrar um “homem branco e instruído”, fato que representa o reencontro com o mundo “civilizado” que se

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-La Serpiente de Oro, porque el río, visto desde arriba, desde el cerro Campana, pongamos por caso, parece una gran serpiente... ¡Y como es tan rico! El nombre resulta apropriado y sugestivo ¿verdad? ¡La Serpiente de Oro! La compañía traerá maquinarias, dragas y se haría un trabajo en forma. Ustedes ganarían vendiendo lo que producen: yucas, plátanos, etc., y trabajando como operarios.... nos llenaríamos de plata. ¿Qué les parece? (ALEGRÍA, 1986, p. 144).

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Através da personagem de D. Matias, um velho sábio que vive no vale, se dá a conhecer a lenda de que na antiguidade os habitantes dessa região adoravam tanto o rio quanto a serpente: “-Me cuntun señor quen tiempos antigos los peruanos adoraban comua meros dioses al río tamién y tamién a la serpiente. Y yo digo que tal vez jué porque la iferencia es poca yal no saber cuál era más ni menos, velay que pa los dos tuvieron adoración...” (ALEGRÍA, 1986, p. 168). A partir das histórias contadas ao redor da fogueira os calemarinos lembram suas tradições, relatos que de forma fabulada tratam da origem, dos temores e das crenças de seus antepassados. Histórias que são incorporadas à realidade atual como forma de tentar descobrir o sentido do rio Marañon conhecido como a serpiente de oro por sua longitude e sua riqueza aurífera, mas que também envenena e mata. Paralelamente à vida dos balseros é relatada a aventura de um engenheiro da capital peruana chamado Osvaldo Martínez de Calderón, o qual se interna na região selvática para criar uma empresa e explorar seus recursos naturais. Martínez de Calderón planejava batizar a empresa como o nome de La serpiente de oro”, como o explica a seguir:

encontrava a quilômetros de distancia: “[...] viendo una cara blanca y una mano fina, pero su contento fue mayor al escuchar, aunque con el acento de la región, un castellano claro y suelto. Era el reencuentro con el mundo dejado allá abajo, hacia el sur, muy lejos...[...] – Créame que es un placer para mí. Estas soledades lo son tanto que, el encuentro con un ser civilizado, por raro, me hace el efecto de uma revelación” (ALEGRÍA, 1986, p.50). Palavras que revelam o menosprezo do engenheiro pelos cholos. A novela revela também de forma clara o contraste cultural entre o engenheiro citadino e

os habitantes de Calemar, um encontro de mundos opostos: o do homem urbano e instruído, impregnado de preconceitos que apresenta uma linguagem e vestimentas totalmente diferentes a dos balseros de Calemar, homens sem nenhuma instrução escolar e um conhecimento de mundo que se limita ao rio e suas serras. Esse antagonismo pode ser constatado na detalhada descrição do forasteiro e dos balseros narrada no seguinte fragmento de La serpiente de Oro: Era un joven de botas, pañuelo al pescuezo y alón sombrero de fieltro. Su elegancia resaltava ante nuestra elemental indumentaria de vallinos: sombrero de junco, camisa de tocuyo, pantalón de bayeta, rudos zapatones u ojotas choclenates y acaso también un gran pañuelo rojo que envuelve el cuello defendiéndolo del sinapismo del sol. Su caballo era um zaino grande bueno, sólo que bisoño en estos lugares y tuvimos que remolcarlo desde la balsa con una soga. El apero relucía en sus piezas plateadas, lo mismo que las espuelas del jinete y la cacha de su revólver, metida en funda que pendía de un cinturón de gran hebilla ( ALEGRÍA, 1986, p.15).

Martínez de Calderón era um homem que acreditava que somente com sua sabedoria urbana poderia vencer a natureza, no entanto essa sabedoria não consegue salvá-lo da morte depois de ser mordido por uma serpente amarela, motivo pelo qual não chegou a cristalizar seu ambicioso projeto. Somente na agonia o narrador revela, mediante os pensamentos que o engenheiro tem pouco antes de morrer, a impotência do homem citadino diante da Natureza:

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A obra de Alegía apresenta também o contraste entre os cholos do vale de Calemar e os habitantes de Shicún. O vale de Calemar localizado às margens do rio Marañon, no limite entre a região andina e a selva amazônica, conservava, devido a sua localização afastada dos centros urbanos, uma relativa independência com relação aos centros administrativos, além de constituir uma comarca demograficamente homogênea, pois todos seus habitantes eram mestiços ou indígenas. Enquanto que Shicún, região onde os calemarinos compravam suas balsas, era um povoado que contava com autoridades, proprietários brancos e trabalhadores cholos. Em Shicún os calemarinos encontram obstáculos diferentes aos enfrentados em sua relação com a natureza: conflitos com as instituições sociais. Na terceira e quarta década do século XX, época em que o livro foi publicado, o regime imperante no Peru favorecia os fazendeiros e patrões, e oprimia os grupos mestiços e indígenas. Regime que constituía um instrumento adverso para os habitantes dos vales que viviam à margem do domínio centralista das capitais. Esses conflitos são revelados na novela através da repressão policial e da situação do “corrido”, personagem nativo que encarna o desejo de liberdade do homem do vale. De acordo com o narrador o corrido é:

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Todo lo que le rodea es tremendo, sorpresivo, y no sabe él mismo de los abismos que ha atravesado en cuerpo y alma, ni de los que podrá atravesar todavía. Y luego piensa que el hombre cuenta poco en estos mundos, y dice, hablando en voz baja, para sí mismo: ‘¡Aquí la Naturaleza es el destino! [...] No dice más, pues da un salto al sentir una punzante mordedura en el cuello. Se vuelve ante algo que le chicotea el hombro y logra ver una serpiente amarilla, delgada y ágil que ha saltado al higuerón y se va entre los árboles pasando, pasando rápidamente de una rama a otra, perdiéndose en la espesura. Como una cinta de oro ha brillado sobre las hojas… (ALEGRÍA, 1971, p. 150).

[...] un cristiano como todos: como usted, como yo. Sólo que es un corrido. La justicia lo persigue y él dejaría primero escapar, gota a gota, toda su sangre, antes de dejarse atrapar y conducir a los pueblos, donde lo dejarían enmohecer como a un trasto inútil en el rincón de cualquier cárcel en tanto que, sobre una mesa se amontonaría el papel sellado. Cuando el rimero de fólios sería juzgado suficiente, él marcharia entonces a la capital del departamento y de allí a Lima, a esa mentada ciudad que nosotros conocemos por dos cosas: allí cambian los gobiernos y allí hay una inmensa cárcel (ALEGRÍA, 1986, p. 160)

A história do corrido pode ser a de qualquer habitante das regiões afastadas que tenha a fatalidade de infringir as normas impostas por um grupo ao que não pertence pelo que para escapar da persecução fica recluído na floresta. Para o homem do vale, o corrido é um amigo em desgraça e se for necessário o balsero escolherá a sorte do corrido para viver em liberdade. De acordo com o próprio Alegría, La serpiente de oro é considerada literatura indigenista devido à orientação realista de sua narração na que revela episódios autobiográficos. Em seu discurso no Primer encuentro de Narradores peruanos realizado em Arequipa no ano de 1965, o escritor peruano declarou: “[…] mis primeras vivencias novelescas las he vivido en el pueblo norteño del Perú, un pueblo indo-hispánico, mestizo, donde el indígena ya no se traduce a través del quechua pero sí a través de una sensibilidad […] influida por elementos hispánicos” (ALEGRÍA, 1986, p. 32). Como se pode ver, as palavras de Ciro Alegría revelam sua experiência de vida junto às

comunidades indígenas do norte do Peru confirmando sua intimidade com a realidade andina tema de seus escritos. La Serpiente de Oro é uma novela que pode ser considerada uma história de vida onde se narra a problemática do homem andino em duas partes. A primeira representada pela luta do indígena contra a natureza e seu esforço por alcançar a harmonia e o equilíbrio com ela, e a segunda, representada, pela sobrevivência desse nativo numa difícil conjuntura, na que a injustiça, a pobreza e a preocupação das autoridades por proteger e salvaguardar os direitos humanos é nula. REFERÊNCIAS ALEGRÍA, Ciro. “Prólogo”. El mundo es ancho y ajeno (1941). Disponível em http://www.luisemiliorecabarren.cl/?q=node/861. Acesso em 29 dez. 2011. ______. La serpiente de oro (1935). Prólogo de Alberto Escobar. Buenos Aires: Losada, 1971. ALEGRÍA, C., ARGUEDAS, J. M. et al. Primer encuentro de narradores peruanos. 2ª ed. Lima: Latinoamericana Editores, 1986. CORNEJO POLAR, Antonio. Escribir en el aire. Lima: Editorial Horizonte, 1994. ______. O condor voa: Literatura e Cultura Latino-Americanas. Org. Mario J. Valdés. Trad. Ilka Valle de Carvalho. Belo Horizonte: UFMG, 2000. ______. La novela indigenista, Lima: Lasontay, 1980.

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